Um buraco de R$ 48
milhões nas contas da Secretaria Municipal de Educação e Cultura (Semec), da prefeitura
de Belém, foi descoberto na folha de pagamento dos servidores, segundo
documentos aos quais o DIÁRIO DO PARÁ teve acesso.
Depois que a auditoria
interna do órgão constatou o rombo, a solução encontrada foi uma manobra
contábil que inclui a anulação de dotações orçamentárias e o remanejamento de
fontes de recursos. Traduzindo: a prefeitura vai cortar R$ 36 milhões que
serviriam para a manutenção das escolas, de acordo com o que revela uma
“planilha de anulação” de investimentos.
No dia 24 passado, o prefeito
Zenaldo Coutinho, avisado do problema e temeroso das consequências – uma delas
seria o atraso no salário dos professores - decidiu convocar às pressas uma
reunião com a secretária de Educação, Nelly Cecília Rocha, cobrando
explicações. Ele queria saber onde e como o dinheiro teria sido gasto.
A reunião foi tensa e a
secretária foi duramente criticada por Coutinho. Ela chegou a ameaçar entregar
o lugar, afirmando que as orientações que ela dava não eram seguidas.
Nelly Rocha, diante de
um Coutinho também nervoso, respondeu que apenas seguia orientações da direção
do governo, em especial do irmão do prefeito, Guto Coutinho, secretário de
Administração, que teria determinado grande quantidade de contratação de
assessores especiais, os chamados DAS, além do pagamento em dia de credores.
No mesmo dia, a
secretária voltou para a sede da Semec e chamou sua equipe de planejamento para
elaborar uma planilha de “anulação de pagamentos”. O objetivo seria cobrir o
déficit na folha de pagamento dos professores, garantindo os salários.
Obras
Com essa anulação a
prefeitura será obrigada a suspender diversas obras no município, como reforma
de escolas, algumas caindo aos pedaços. Uma das consequências do rombo nos recursos,
contudo, já ocorreu: o atraso no pagamento do vale-alimentação da categoria. O
presidente da Associação dos Concursados do Pará (Asconpa) José Emílio Almeida,
de posse de documentos que comprovariam a má gestão e o rombo nas contas da
Semec, anunciou que nesta terça-feira ingressará, junto ao Ministério Público
do Estado (MPE), com pedido de apuração das irregularidades.
“Não estou certo de que
não se trata apenas de incompetência na gestão de recursos públicos, mas ao que
parece ficar evidente é a existência de um poderoso esquema de desvios de
dinheiro para todos os fins, inclusive eleitorais”, afirmou Emílio Almeida.
Muito mais assessores e
prestadores
A folha de pagamentos da
Semec, na verdade, vem inchando desde o começo da gestão de Zenaldo Coutinho.
No final da gestão do prefeito Duciomar Costa, em dezembro do ano passado, por
exemplo, havia 88 cargos de DAS na secretaria. Mal Coutinho assumiu, o número
pulou para 144, com média salarial de R$ 4 mil. O mais grave, porém, aconteceu
na folha de pagamento dos prestadores de serviços. Com Duciomar, o custo era de
R$ 900 mil, mas com Coutinho deu um salto e hoje supera R$ 2 milhões.
Essa folha dos
prestadores é intocável, pois não sofre qualquer ingerência da Secretaria de
Gestão e Planejamento (Segep), e da Secretaria Municipal de Administração
(Semad), órgãos fiscalizadores da prefeitura. A tal folha sai da Semec para os
dois órgãos apenas com informações dos valores que devem ser pagos. A lista de
pagamentos anexada aos valores, segundo garante uma fonte, está sempre
incompleta.
Na lista, há professor
que receberia 300 horas, o que é inverídico, porque a carga é de no máximo 240
horas. Também aparece motorista com pagamento de R$ 4 mil a R$ 5 mil mensais. A
folha não passa pelo gerenciamento de pessoal. Entra diretamente no sistema de
planilha Excel. Tudo passa pelas mãos da secretária de Educação, Nelly Cecília
Rocha, a ordenadora de despesas, mas que é vista na Semec como mera cumpridora
de ordens.
Folha
É voz corrente nos
corredores do órgão que o comandante de tudo é o secretário de Administração,
Guto Coutinho, irmão do prefeito, que conta com a ajuda da diretora
administrativa da Semec, Luanda Freire. Ela é quem diz quem entra ou não entra
na folha de prestadores.
A cota de DAS, para
piorar, já está estourada, embora ainda haja mais gente para entrar. A folha da
Semec já beira os R$ 25 milhões. Só os efetivos e inativos consomem, R$ 20
milhões, mais R$ 5 milhões de prestadores, DAS, tíquetes de alimentação e transporte. Que
não se assustem os professores e demais servidores lotados na folha da Semec,
porque eles devem receber outubro sem problemas. Em dezembro, segundo uma
fonte, é que o “bicho vai pegar”.
A projeção do ano
passado era para que os concursados da prefeitura fossem chamados. Coutinho
encontrou uma solução política, mas bancada pelo contribuinte. Ele chamou os
concursados, mas paralelamente dobrou o número de prestadores de serviço e sem
mexer no pessoal que Duciomar deixou dentro da Semec.
As fontes de recursos, é
lógico, não podiam suportar o malabarismo do prefeito. O efeito produzido foi o
rombo que agora todos correm para tapar.
O DIÁRIO ligou para os
telefones do prefeito Zenaldo Coutinho e da secretária de Educação, Nelly
Cecília Rocha, mas não conseguiu. As operadoras informavam que os telefones de
ambos estavam desligados ou fora da área de serviço. O mesmo ocorreu com o
telefone do secretário Guto Coutinho, que também estava desligado. Na Comus,
área de comunicação do governo municipal, ninguém foi encontrado.
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