sábado, 27 de junho de 2015

Como poderosos barram Lei de Acesso para manter a roubalheira

Blog do Claudio Tognolli

Pai do conceito de transparência no Brasil, o matemático e jornalista Cláudio Weber Abramo vai ser homenageado: no próximo dia 2 de julho, no décimo congresso internacional de jornalismo da Abraji, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (www.abraji.org.br).

Às vésperas de completar seus 70 anos, Cláudio Weber Abramo sabe como ninguém porque o Brasil não funciona. Afinal ele mesmo foi um dos avôs espirituais da Lei de Acesso, sancionada por Dilma Rousseff – e que, como se esperava, não funciona porque muita gente lá em cima não deixa funcionar. Simples assim.

Cláudio Weber Abramo recebeu este blog para relatar tudo o que você queria ouvir: porque o Brasil continua um antro de corrupção, seja a dos tucanóides Alstom, seja o dos petistas Petroleiros. Enfim: quem são as pessoas que emperram o país e obstam a cidadania fabulando situações caleidoscópicas, helicoidais, para que jornalistas, sobretudo, sejam toureados.

Confira Abramo ensinando como e porque é driblada a Lei de Acesso. E para você, fã de promotores e procuradores, Abramo alerta: “Não há no país instituição mais opaca do que o MP. Praticamente nada se conhece sobre ele”.

Em 1913 o da Suprema Corte dos EUA, Louis Brandeis, escreveu que a luz do sol é o melhor detergente. Mesmo com as sunshine laws lá, desde 1968, tivemos o caso Snowden. Tais leis funcionam ou são cosméticas?

Funcionam, sim. O que esse tipo de lei estabelece é que o poder público precisa prestar informações a respeito do que faz. No Brasil, isso está garantido na Constituição, no Artigo 37, que estabelece o dever de publicidade do Estado (que, por aqui, é frequentemente confundido com a direito de o governante contratar uma agência de publicidade…).

Coisa um pouco diferente é o direito de qualquer pessoa pedir informações ao poder público. Nos EUA, por exemplo, esse direito não está na Constituição, tendo sido incluído no Freedom of Information Act (FOIA), de 1966. No Brasil, a Constituição também garante esse direito (no Inciso 33 do Artigo 5º), mas o texto desse artigo diz que a prestação da informação se dará “no prazo da lei”.

Como não havia lei, os agentes públicos de modo geral interpretavam o “prazo da lei” como sendo infinito, e simplesmente se negavam a cumprir a obrigação. Quem quisesse que fosse ao STF – como alguns jornais fizeram, e venceram.

No entanto, ir ao STF custa bastante dinheiro, de forma que não era viável esperar que todo mundo que perguntasse alguma coisa a uma repartição qualquer e recebesse de volta o silêncio ou uma negativa malcriada pagasse uma fortuna para entrar com uma ação no STF. Isso, bem como outras peculiaridades, justificou a necessidade da lei de acesso a informação brasileira.

Pois bem, para finalmente responder à pergunta: a lei estabelece: 1) algumas informações que obrigatoriamente precisam ser publicadas, independentemente da solicitação de alguém – principalmente referentes ao gasto de dinheiro. 2) as condições sob as quais pedidos de informação devem ser tratados: prazos, mecanismos de recurso quando há negativa e outras.

Em outras palavras, a lei regulamenta a oferta de informação – mas isso não garante demanda. A demanda depende da existência de gente que solicite informação. E isso falta muitíssimo no Brasil. Os principais demandantes de informação em lugares menos incivilizados são o setor privado, a imprensa, ONGs e a academia.

No Brasil, a única que busca informações sistematicamente é a imprensa. Algumas ONGs começam a fazer isso, mas são incipientes. De forma que para desinfetar o Estado com a luz do sol, como afirmou Brandeis, não basta o sol existir. É preciso haver quem queira tomar banho de sol, por assim dizer.

Quais as lacunas na Lei de Acesso de Dilma, da qual você foi um dos inspiradores ?

A lei de acesso da presidente Dilma, mas foi lentamente trabalhada ao longo do segundo governo Lula. Duas entidades trabalharam muito para isso: a Abraji, especialmente sob a liderança do jornalista Fernando Rodrigues, e a Transparência Brasil. Há na lei de acesso brasileira um dispositivo que permite a qualquer chefe de poder em qualquer esfera definir arbitrariamente o que são informações sigilosas, secretas etc. Isso não existia antes da lei e corresponde a um defeito inevitável a partir do momento em que a coisa toda é regulamentada.

Explico: antes da lei, o presidente do Tribunal de Justiça não podia meramente declarar “os gastos dos gabinetes dos desembargadores são secretos”. Hoje pode, porque a lei precisava regulamentar essa questão devido à real existência de segredos de Estado (alguns tratados internacionais, por exemplo).

De modo que o sujeito que é chefe de um poder define o que é secreto e o que não é à vontade. Estão fazendo isso pelo país inteiro. É natural perguntar: mas esse tipo de atitude é patentemente descabida e dever haver alguém a quem recorrer. O problema é que não há, em condições normais. A máxima autoridade de uma circunscrição administrativa (como um tribunal, uma câmara de vereadores, um tribunal superior) é quem decide os recursos de interessados aos quais tenha sido afirmado que tal ou qual informação é sigilosa e por isso não pode ser prestada.

Ou seja, não é que a raposa entrou no galinheiro – nem sequer há galinheiro, mas um raposeiro. Ainda pior é o que estará acontecendo na maior parte do país com a aplicação da lei: não está sendo aplicada, principalmente por falta de demanda. Mesmo quando há demanda, há lugares em que os governantes agem com a maior desfaçatez.

O estado do Rio de Janeiro é um exemplo. Promulgou-se por lá uma regulamentação do acesso à informação que não só entra em choque com a lei federal como vai além, sendo patentemente inconstitucional. 

O que faz o Ministério Público, cujo dever é garantir o cumprimento da lei?

Ora, o Ministério Público. Começa pela circunstância de que não há no país instituição mais opaca do que o MP. Praticamente nada se conhece sobre ele. Além disso, apesar de toda a conversa de que o MP é independente politicamente e tal e coisa, na prática a vasta maioria dos MPs estaduais é muito comprometida. E meramente não fazem a lei ser cumprida.

Como a lei de acesso teria evitado coisas como caso do escândalo metroviário em São Paulo e do Petrolão?

Esses casos, como outros, não têm relação alguma com acesso a informação. Têm a ver com a inépcia administrativa de quem manda nessas empresas. Chega a ser inacreditável a incompetência da gestão das empresas do setor metro-ferroviário paulista, que levou a altíssimos desperdícios. A documentação correspondente não permite outra conclusão: os caras perguntavam quanto as empresas do cartel estavam dispostas a receber para executar os serviços e, na sequência, diziam que o preço seria aquele. É como entrar no botequim, perguntar o preço de um sanduíche de queijo, receber como resposta que o preço são R$ 4,5 mil e dizer “ manda lá o sanduíche”.

Era literalmente assim que o Metrô e a CPTM agiam. O pior é que, por tudo o que se sabe (ou não se sabe), devem estar fazendo mesma coisa hoje. No caso da Petrobras, a inépcia administrativa se manifestava na inexistência de mecanismos de controle sobre processos de contratação realizados sob uma regulamentação (promulgada ainda no governo FHC) notoriamente vulnerável à corrupção.

A saber, o Conselho de Administração e a Diretoria da Petrobras sabiam perfeitamente bem que as regras de licitação da Petrobras são um convite à “propinagem” e, em vez de apertar os controles, fingiram que o assunto não era com eles. Não podia dar certo, em particular quando a empresa era governada por figuras colocadas nos postos de comando por interesses partidários. O espantoso seria que algo funcionasse por lá.

2 comentários:

Anônimo disse...

Alguém pode, por gentileza, informar-me se o concurso da SEMEC foi prorrogado ? Desde de já, muito obrigado.

Anônimo disse...

Alguém pode, por gentileza, informar-me se o concurso da SEMEC 2012 foi prorrogado ? Desde de já, muito obrigado, de verdade.